Novo episódio do Podcast Papo Filosófico

quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

COESÃO E COERÊNCIA



COESÃO E COERÊNCIA
"Todos os estudos procuram demonstrar que a coerência é profunda, subjacente à superfície linguística do texto, não linear, não marcada explicitamente na estrutura da superfície", enquanto que a coesão é explicitamente revelada através de marcas linguísticas, índices formais na estrutura da seqüência linguística e superficial do texto, sendo, portanto, de caráter linear". " Os elementos linguísticos da coesão não são nem necessários, nem suficientes para que a coerência seja estabelecida. Haverá sempre necessidade de recurso a conhecimento exteriores ao texto (conhecimento de mundo, dos interlocutores, da situação, de normas sociais, etc.)"
(Koch e Travaglia, 1990, comentando Charolles, 1989).


COERÊNCIA TEXTUAL

         "nenhum dos conceitos encontrados na literatura é capaz de conter em si todos os aspectos definidores de coerência"
         "a coerência teria a ver com a boa formação do texto em termos da interlocução comunicativa."
         "ela é o que faz com que o texto faça sentido para os usuários (...) devendo ser vista como princípio de interpretabilidade do texto"
         "possibilidade de estabelecer alguma forma de unidade ou  relação. Essa unidade é sempre apresentada como referente ao texto como um todo".
KOCH E TRAVAGLIA (1989; 1990)

         " A coerência tem como fundamento a continuidade de sentidos, dizendo respeito ao modo como os componentes do mundo textual, isto é, a configuração de conceitos e relações subjacentes à superfície do texto, são mutuamente acessíveis e relevantes".
BEAUGRAND E DRESSLER (1981)

A COESÃO NÃO É NECESSÁRIA:

(1) CORTE  (Maria Amélia Mello)
(O dia segue normal. Arruma-se a casa. Limpa-se em volta. Cumprimenta-se os vizinhos. Almoça-se ao meio-dia. Ouve-se rádio a tarde. Lá pelas 5 horas, inicia-se o sempre).

(2)   O SHOW

          O cartaz
          O desejo
          O pai

          O dinheiro
          O ingresso
                                              
          O dia                               
          A preparação
          A ida                                
            
                                 
          O estádio   
          A multidão
          A expectativa

          A música
          A vibração
          A participação

          O fim
          A volta
          O vazio

     
     (texto de aluno de 1o. grau, calcado no modelo do poema
" A Pesca de Affonso Romano de Sant'Anna, citado por Koch e Travaglia, 1990)


(3a)    A: O telefone!
        B: Estou no banho!
        A: Certo.


(3b)A:  O telefone(está tocando. Você
        pode atender, por favor?)
    B:  (Não, não posso atender porque)
        Estou no banho.
    C:  Certo(eu vou atender)



A possibilidade de estabelecer uma relação (normalmente semântica e/ou pragmática) entre os elementos da seqüência, criando uma unidade, é que é fundamental para a coerência. Às vezes, essa possibilidade fica na dependência de um único elemento do texto.

(4) Petróleo
É utilizado no transporte, na produção de energia e nos mais diferentes tipos de indústria, através de seus numerosos subprodutos, sendo, por isso fundamental à vida humana.
Embora a produção brasileira seja insuficiente para o consumo interno, o país tem envidado esforços para, dentro em breve, não depender mais de sua importação.

A COESÃO NÃO É SUFICIENTE:
(5) O gato comeu o peixe que meu pai pescou. O peixe era grande. Meu pai é alto. Eu gosto do meu pai. Minha mãe também gosta. O gato é branco. Tenho muitas roupas brancas.

(6) João vai à padaria. A padaria é feita de tijolos. Os tijolos são caríssimos. Também os mísseis são caríssimos. Os mísseis são lançados no espaço. Segundo a teoria da Relatividade o espaço é curvo. A geometria Rimaniana dá conta desse fenômeno.
(Marcushi, 1983, p.31)

Possibilidade de existência de textos incoerentes
    " Texto incoerente é aquele em que o leitor ou ouvinte não consegue descobrir qualquer continuidade de sentido, seja pela discrepância entre os conhecimentos ativados, seja pela inadequação entre esses conhecimentos e o seu universo cognitivo."
" Uma vez que se aceita que não existe o texto incoerente em si, mas apenas que o texto pode ser incoerente para alguém em determinada situação discursiva, o professor deve trabalhar a produção ( e também a compreensão de textos, buscando, sempre, deixar muito claro em que situação o texto a ser produzido deve ser encaixado.
(Koch e Travaglia, 1989, p.32)

(7) João Carlos vivia em uma pequena casa construída no alto de uma colina árida, cuja frente dava para leste. Desde o pé da colina se espalhava em todas as direções, até o horizonte, uma planície coberta de areia. Na noite em que completava 30 anos, João, sentado nos degraus da escada colocada à frente de sua casa, olhava o sol poente e observava como a sua sombra ia diminuindo no caminho coberto de grama. De repente, viu um cavalo que descia para a sua casa. As árvores e as folhagens não permitiam ver distintamente: entretanto observou que o cavalo era manco. Ao olhar de mais perto verificou que o visitante era seu filho Guilherme, que há 20 anos tinha partido para alistar-se no exército, e, em todo este tempo, não havia dado sinal de vida. Guilherme, ao ver seu pai, desmontou imediatamente, correu até ele, lançando-se nos seus braços e começando a chorar.
 Koch e Travaglia, 1989, p. 33)

NUM OUTRO MUNDO
   Desde o início dos anos 80, sabe-se em todo o mundo que a AIDS mata. desde o início dos anos 80, sabe-se em todo o mundo que a única forma de prevenção relativamente eficaz contra a transmissão da moléstia é o uso da camisa-de-vênus - a camisinha - da qual o governo está sem estoques, como revelou ontem esta Folha. As autoridades sanitárias brasileiras, contudo, parecem estar num outro mundo.
   Além de umas poucas e tímidas campanhas mostrando a importância dos preservativos para a prevenção da AIDS e de algumas belas, porém quase inócuas, peças afirmando não haver razão para discriminar doentes, as autoridades nada de significativo fizeram. É verdade que o Brasil, convive com muitas outras doenças que, por enquanto, ainda são mais letais que a síndrome. Mas é importante observar que a AIDS é incurável e tem potencial geométrico de propagação.
   A única forma de tentar reverter a ascendente curva da morte - e isso 's possível, o Zaire já conseguiu - é fazer com que a população use maciçamente a camisinha. Segundo a OMS, para cada milhão de preservativos usados, evitam-se 303 casos de infecção do HIV. No mercado internacional, com o custo unitário da camisinha a US$ 0,03, impedir uma contaminação sai por US$ 99. Tratar um aidético pode custar milhares de dólares.
   Entretanto, no Brasil, o custo da camisinha chega a ser, devido à cobrança de ICMS e IPI e de outras exigências burocráticas, 14 vezes superior ao do similar no mercado internacional.
   Enfim, passados mais de dez anos da descoberta da doença e da forma mais conhecida de preveni-la, só agora as autoridades sanitárias estão cogitando de pedir a isenção de impostos para o produto e a liberalização das importações. A título de exemplo da miopia do governo, o diamante lapidado está isento de IPI; a camisinha paga 15%.
                  (Folha de São Paulo, 15/08/95)
FAZENDO AS CONEXÕES
     Uma preocupação de quem escreve é ver se os conectores estão empregados com precisão. A toda hora estamos fazendo uso deles. Por isso, damos a seguir uma lista sucinta desses conectivos e suas respectivas funções:
conjunções, locuções conjuntivas, preposições e locuções prepositivas:

1.  adição - e, nem, também, não só... mas também.
2.  alternância - ou... ou, quer...quer, seja...seja.
3.  causa - porque, já que, visto que, graças a, em virtude de, por (+ infinitivo).
4.  conclusão - logo, portanto, pois.
5.  condição - se, caso, desde que, a não ser que, a menos que.
6.  comparação - como, assim como.
7.  conformidade - conforme, segundo.
8.  conseqüência - tão...que, tanto... que, de modo que, de sorte que, de forma que, de maneira que.
9.  explicação - pois, porque, porquanto.
10. finalidade - para que, a fim de que; para (+ infinitivo).
11. oposição - mas, porém, entretanto; embora, mesmo que; apesar de (+ infinitivo).
12. proporção - à medida que, à proporção que, quanto mais, quanto menos.
13. tempo - quando, logo que, assim que, toda vez que, enquanto.

Pronomes relativos:  que - quem - cujo - onde.
Ao empregar um pronome relativo devemos ter o seguinte cuidado:
1. ver a palavra a que ele se refere para evitar erros de concordância verbal.
Ex.: Encontramos um bom número de pessoas que estavam reivindicando os mesmos direitos que nós.
Que = as quais (pessoas)
2. Observar o fragmento de frase de que ele faz parte. Pode ser que haja um verbo ou um substantivo que exija uma preposição. Neste caso, ela deve preceder o relativo.
Ex.: Ninguém conseguiu até hoje esquecer a cilada de que ele foi vítima.
de que = da qual (cilada)
A preposição de foi exigida pelo substantivo vítima. A pessoa foi vítima de uma cilada.
O mesmo acontece com os verbos.
Ex.: As dificuldades a que você se refere são normais dentro de sua carreira.
a que = às quais (dificuldades)
O verbo referir-se pede a preposição a, por isso ela aparece antes do que.

AS TRANSIÇÕES
     Alguns dos conectores que acabamos de estudar também aparecem com freqüência iniciando frases, como se fossem uma espécie de ponte entre um pensamento e outro.
     O conhecimento desses termos de transição ajuda a dar maior organicidade ao pensamento, fazendo o texto progredir mais fácil. Mas é preciso uma advertência: não devemos usá-los a cada frase começada. Se fizermos assim, tornaremos o texto pesado. Também não devemos cair no oposto: ignorá-los completamente. Nosso texto correrá o risco de ficar cansativo, quando não incompreensível. Saber usar os termos de transição deve ser uma preocupação constante de quem deseja escrever bem. Eles são muito úteis ao mudarmos de parágrafo porque estabelecem pontes seguras entre dois blocos de idéias.

Eis os mais importantes e suas respectivas funções:
1.  afetividade: felizmente, queira Deus, pudera, oxalá, ainda bem (que).
2.  afirmação: com certeza, indubitavelmente, por certo, certamente, de fato.
3.  conclusão: em suma, em síntese, em resumo.
4.  conseqüência: assim, consequentemente, com efeito.
5.  continuidade: além de, ainda por cima, bem como, também.
6.  dúvida: talvez, provavelmente, quiçá.
7.  ênfase: até, até mesmo, no mínimo, no máximo, só.
8.  exclusão: apenas, exceto, menos, salvo, só, somente, senão.
9.  explicação: a saber, isto é, por exemplo.
10. inclusão: inclusive, também, mesmo, até.
11. oposição: pelo contrário, ao contrário de.
12. prioridade: em primeiro lugar, primeiramente, antes de tudo, inicialmente.
13. restrição: apenas, só, somente, unicamente.
14. retificação: aliás, isto é, ou seja.
15. tempo: antes, depois, então, já, posteriormente.



COESÃO TEXTUAL
         Ulysses era impressionante sob vários aspectos, o primeiro e mais óbvio dos quais era a própria figura. Contemplado de perto, cara a cara, ele tinha a oferecer o contraste entre as longas pálpebras, que subiam e desciam pesadas como       cortinas de ferro, e os olhos claríssimos, de um azul leve como o ar. As pálpebras anunciavam profundezas insondáveis. Quando ele as abria parecia estar chegando de regiões inacessíveis, a região dentro de si onde guardava sua força.
                  Roberto Pompeu de Toledo, Veja, 21-10-92.

     Em nenhum momento, o autor da reportagem se desvia do assunto (Ulysses Guimarães) porque  se manteve atento à coesão. Para escrever de forma coesa, há uma série de recursos, como:
1. O uso de epítetos: palavra ou frase que qualifica pessoa ou coisa.
    Glauber Rocha fez filmes memoráveis. Pena que o cineasta mais famoso do cinema brasileiro tenha morrido tão cedo.
Glauber Rocha foi substituído pelo qualificativo cineasta mais famoso do cinema brasileiro.
2. Nominalizações: o emprego de um substantivo que remete a um verbo enunciado anteriormente.
   Eles foram testemunhar sobre o caso. O juiz disse, porém, que tal testemunho não era válido por serem parentes do assassino.
Pode também ocorrer o contrário: um verbo retomar um substantivo já enunciado
   Ele não suportou a desfeita diante de seu próprio filho. Desfeitear um homem de bem não era coisa para se deixar passar em branco.
3. Palavras ou expressões sinônimas ou quase-sinônimas
   Os quadros de Van Gogh não tinham nenhum valor em sua época. Houve telas que serviram até de porta de galinheiro.
4. Repetição de uma palavra (com ou sem determinante) quando não for possível substituí-la por uma outra.
    Cultura é a forma como a gente se veste. Cultura engloba também as manifestações artísticas. Cultura é a soma de todos os hábitos de um povo. Qualquer cultura, portanto, tem elementos de interesse para um antropólogo.
5. Um termo-síntese
       O país é cheio de entraves burocráticos. É preciso preencher um sem-número de papéis. Depois, pagar uma infinidade de taxas. Todas essas limitações acabam prejudicando o importador.
A palavra limitações sintetiza o que foi dito antes.
6. Pronomes
   Vitaminas fazem bem à saúde. Mas não devemos tomá-las ao acaso.
   O Colégio é um dos melhores da cidade. Seus dirigentes se preocupam muito com a educação integral.
   Aquele político deve ter um discurso muito convincente. Ele já foi eleito seis vezes.
   Há uma grande diferença entre Paulo e Maurício. Este guarda rancor de todos, enquanto aquele tende a perdoar.
7. Numerais
   Não se pode dizer que toda a turma esteja mal preparada. Um terço pelo menos parece estar dominando o assunto.
   Recebemos dois telegramas. O primeiro confirmava a sua chegada; o segundo dizia justamente o contrário.
8. Advérbios pronominais (aqui, ali, lá, aí)
   Não podíamos deixar de ir ao Louvre. Lá está a obra-prima de Leonardo da Vinci: A "Mona Lisa".
9. Elipse
   O ministro foi o primeiro a chegar.(Ele) Abriu a sessão às oito em ponto e (ele) fez então seu discurso emocionado.
10. Repetição do nome próprio (ou parte dele)
   Manuel da Silva Peixoto foi um dos ganhadores do maior prêmio da loto. Peixoto disse que ia gastar todo o dinheiro na compra de uma fazenda e em viagens ao exterior.
   Lygia Fagundes Telles é uma das maiores escritoras brasileiras da atualidade. Lygia é autora de "Antes do baile verde", um dos melhores livros de contos de nossa literatura.
11. O uso da metonímia: processo de substituição de uma palavra por outra, fundamentado numa relação de contiguidade semântica.
    O governo tem-se preocupado com os índices de inflação. O Planalto diz que não aceita qualquer remarcação de preço.
    Santos Dummont chamou a atenção de toda Paris. O Sena curvou-se diante de sua invenção.

terça-feira, 22 de janeiro de 2013

O ETHOS E A IDEOLOGIA DOS USUÁRIOS DO FACEBOOK









O I Encontro Interdisciplinar de Linguagem, Discurso e Enunciação (EILDE) é um evento de natureza acadêmico-científica que reúne pesquisadores, professores, estudantes de graduação e de pós-graduação, que se interessam pelo estudo da língua e da linguagem em suas múltiplas dimensões: texto, discurso, identidade social, letramento, ensino-aprendizagem, aquisição e distúrbio.
Congrega, por isso, estudantes e profissionais das áreas de letras e linguística, assim como de áreas afins: pedagogia, fonoaudiologia, psicologia, comunicação social, antropologia e filosofia, que discutem e apresentam seus dados e objetos de pesquisa.
Em sua primeira versão, o EILDE conta com a presença do Prof. Dr. Alain Rabatel da Universidade de Lyon I (França), cuja conferência de abertura versa sobre o engajamento na análise do discurso, e com a participação, em quatro mesas-redondas, que versam sobre os seguintes temas: dialogismo, pragmática, antropologia linguística, aquisição de linguagem, multimodalidade e subjetividade. Participam das mesas professores doutores, pesquisadores dos programas de pós-graduação de quatro universidades: UFPE, UFRPE, UFPB e UNICAP. Participam, também, do evento professores/pesquisadores e estudantes de pós-graduação que apresentam e discutem seus objetos de pesquisa em nove sessões de comunicação, somando um total de 43 trabalhos. O evento conta, ainda, com a presença de alunos de graduação que apresentam seus dados de pesquisa em sessão de pôster.
Em suma, o evento reúne a comunidade acadêmica interessada em discutir e pensar questões de língua e linguagem no âmbito do texto, do discurso e/ou das questões de aquisição e distúrbio.
Para a realização desse evento, fundamental é a participação dos funcionários dos diferentes setores da Universidade Católica de Pernambuco, assim como do apoio dos seus dirigentes. Destaca-se, ainda, a equipe de monitores formada por alunos da graduação em Letras e do Mestrado em Ciências da
Linguagem.


Comunicação apresentada por José Antonio Ferreira da Silva

O ETHOS E A IDEOLOGIA DOS USUÁRIOS DO FACEBOOK

RESUMO:
Sabendo-se que o discurso é uma forma de materialização da ideologia (ORLANDI, 2010), acreditamos, que os elementos linguísticos são pistas discursivas que textualizam ideologias subjacentes a sua formação. Com esse raciocínio este trabalho tem por objetivo geral relatar como é constituído o ethos pré-discursivo e discursivo de usuários do Facebook a partir do que eles revelam em suas postagens quando discutem, comentam ou simplesmente compartilham algo em seus perfis. Os objetivos específicos são identificar como é o cenário enunciativo, o tom, o caráter e a corporalidade apresentados nas postagens retiradas de seus perfis, uma vez que essas postagens expressam crenças e ideologias que influenciam os interlocutores com fins persuasivos, utilizando para tal identificação, as pistas discursivas deixadas por esses sujeitos. A problemática apontada neste estudo é trazer algumas reflexões acerca do ethos religioso propagado na internet através do Facebook por seus usuários, procurando observar e analisar como os enunciadores desses perfis persuadem, seduzem e atraem seus interlocutores. Fundamentamos este trabalho nos estudos inseridos no âmbito da Análise do Discurso de linha francesa, mediante as teorias sobre o ethos, mídium e cena de enunciação de Maingueneau (2008a; 2008b; 2008c; 2008d; 2010; 2011).

PALAVRAS-CHAVES: Discurso. Ethos. Ideologia. Facebook.